Defesa da dissertação: “Do mesmo à ruptura: ensaios..."

29 novembro, 2009




(O plano rachado: a ruptura no guarda-sol do juízo que faz passar um pouco de luz e de caos).


Caros amigos,
Não digo que é como ter um filho porque:
1) Não tenho parâmetro para a comparação, pois não sou pai de ninguém;
2) Prefiro me ver, antes, como uma parteira que como uma figura paterna: a ideia de ter de encaminhar alguém pela vida afora, ao menos por enquanto, é um tanto perturbadora, e creio que, por ora, só me cabe dizer que quero “ajudar a nascer”.
Dia 1º.12.2009 defenderemos nossa dissertação no Curso de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal de Santa Catarina (junto à UFPR e à USP, um dos três cursos no Brasil a ter conceito 6, segundo a CAPES), na área de Filosofia e Teoria do Direito, com pesquisa sob o título: “Do mesmo à ruptura: ensaios sobre a filosofia do direito e o novo no jurídico”, orientada pela Profª Drª Jeanine Nicolazzi Phillippi.
A banca ocorrerá no 3º andar do Centro de Ciências Jurídicas (UFSC, Campus Trindade), e contará com a prestigiosa presença de:
* Presidente: Profª Drª Jeanine Nicolazzi Phillippi, mestre doutora em Filosofia e Teoria do Direito pela UFSC, e professora dos cursos de Graduação e Pós-Graduação em Direito da UFSC;
* Membro Externo: Prof. Dr. Eladio Constantino Pablo Craia, mestre e doutor em Filosofia pela UNICAMP-SP, e professor dos cursos de Graduação e Pós-Graduação em Filosofia da UNIOESTE e da PUC-PR;
* Membro da UFSC: Prof. Dr. Selvino José Assmann, mestre e doutor em Filosofia pela Pontificia Università Lateranense, de Roma, na Itália, professor dos cursos de Graduação e Pós-Graduação em Filosofia da UFSC e tradutor de diversos textos de Giorgio Agamben no Brasil.
Convido os amigos a aparecerem e prestigiarem esse importante momento na vida de uma parteira – não quando ela ajuda a nascer a próxima criança, mas quando ela deixa a criança tentar caminhar sozinha.


Sobre o conceito de rizoma

28 novembro, 2009


Contrariando a lógica binária, que, segundo Deleuze e Guattari, seria a lógica da árvore-raiz, segundo a qual, em última análise, tudo seria remissível a uma forte unidade principal (um tronco que desce às origens da planta), os autores propõem, contra a racionalidade da lingüística, do estruturalismo e da informática, o rizoma. O rizoma é caracterizado segundo seis princípios: 1º e 2º. Princípios de conexão e heterogeneidade: “Qualquer ponto de um rizoma pode ser conectado a qualquer outro e deve sê-lo”; 3º. Princípio da multiplicidade, segundo o qual “é somente quando o múltiplo é efetivamente tratado como substantivo, multiplicidade, que ele não tem mais relação nenhuma com uno como sujeito ou como objeto, como realidade natural ou espiritual, como imagem e mundo. As multiplicidades são rizomáticas e denunciam as pseudomultiplicidades arborescecntes”; 4º. Princípio de ruptura a-significante, “contra os cortes demasiado significantes que separam as estruturas, ou que atravessam uma estrutura. Um rizoma pode ser rompido, quebrado em qualquer lugar, e também retoma segundo uma ou outra de suas linhas e segundo outras linhas”; 5º e 6º. Princípio da cartografia e da decalcomania: “um rizoma não pode ser justificado por nenhum modelo estrutural ou gerativo. Ele é estranho a qualquer idéia de eixo genético ou de estrutura profunda”. Para Deleuze e Guattari, “Toda lógica da árvore é uma lógica do decalque e da reprodução. (...). A árvore articula e hierarquiza os decalques, os decalques são como folhas da árvore. Diferente é o rizoma, mapa e não decalque. (...). O mapa é aberto, conectável, reversível, suscetível de receber modificações constantemente. Ele pode ser rasgado, revertido, adaptar-se a montagens de qualquer natureza, ser preparado por um indivíduo, um grupo, uma formação social. (...). Um mapa tem múltiplas entradas contrariamente ao decalque que volta sempre ‘ao mesmo’.”

Olhares: Nietzsche e o perspectivismo

27 novembro, 2009





“De agora em diante, senhores filósofos, guardemo-nos bem contra a antiga, perigosa fábula conceitual que estabelece um 'puro sujeito do conhecimento, isento de vontade, alheio à dor e ao tempo', guardemo-nos dos tentáculos de conceitos contraditórios como 'razão pura', 'espiritualidade absoluta', 'conhecimento em si'; - tudo isso pede que se imagine um olho que não pode absolutamente ser imaginado, um olho voltado para nenhuma direção, no qual as forças ativas e interpretativas, as que fazem com que ver seja ver-algo, devem estar imobilizadas, ausentes; exige-se do olho, portanto, algo absurdo e sem sentido. Existe apenas uma visão perspectiva, apenas um conhecer perspectivo; e quanto mais afetos permitimos falar sobre uma coisa, quanto mais olhos, diferentes olhos, soubermos utilizar para essa coisa, tanto mais completo estará nosso “conceito” dela, nossa “objetividade”. Mas eliminar a vontade inteiramente, suspender os afetos todos sem exceção, supondo que conseguíssemos: como? – não seria castrar o intelecto?” NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. Genealogia da moral, (III, 12).

Poéticas do devir: Heráclito e Jorge Luis Borges

26 novembro, 2009




Fragmentos
de Heráclito
 “Transformando-se, repousa.” (Heráclito, Fragm. 82);
“O mesmo é vivo e morto, vivendo-morrendo a vigília e o sono, tanto novo como velho; pois estes se alterando são aqueles, e aqueles se modificando são estes.” (Heráclito, Fragm. 88);
“Não se pode entrar duas vezes no mesmo rio.” (Heráclito, Fragm. 91);
“O frio se esquenta, o quente se esfria, o úmido seca, o seco se umidifica.” (Heráclito, Fragm. 126).

*  *  *

Arte Poetica
de Jorge Luis Borges

Mirar el río hecho de tiempo y agua
y recordar que el tiempo es otro río,
saber que nos perdemos como el río
y que los rostros pasan como el agua.

Sentir que la vigilia es otro sueño
que sueña no soñar y que la muerte
que teme nuestra carne es esa muerte
de cada noche, que se llama sueño.

Ver en el día o en el año un símbolo
de los días del hombre y de sus años,
en una música, un rumor y un símbolo,

ver en la muerte el sueño, en el ocaso
un triste oro, tal es la poesía
que es inmortal y pobre.
La poesía
vuelve como la aurora y el ocaso.

A veces en las tardes una cara
nos mira desde el fondo de un espejo;
el arte debe ser como ese espejo
que nos revela nuestra propia cara.

Cuentan que Ulises, harto de prodigios,
lloró de amor al divisar su Itaca
verde y humilde. El arte es esa Itaca
de verde eternidad, no de prodigios.

También es como el río interminable
que pasa y queda y es cristal de un mismo
Heráclito inconstante, que es el mismo
Y es otro, como el río interminable.


*  *  *
Uma prosa sobre o tempo
por Murilo Duarte Costa Corrêa

O devir é o que põe em movimento a substância, sem confundir-se com seu movimento, nem com a substância mesma; o devir é o princípio do movimento, o que o faz principiar, um seu começo. Por isso, Borges escreve “el rio hecho de tiempo y água”. O rio não é feito só de água; no fluir da água está o fluir do tempo – de um tempo que não é uma sucessão de instantes, mas precisamente um diferenciador de instantes que se sucedem: o tempo real não se confunde com os instantes, mas passa entre um instante e outro. É, como já ouvi Deleuze dizer a respeito da diferença, “o precursor sombrio, o entretempo”. O tempo é um outro rio, e flui por si, sem ser sustentado nem fundado: o tempo é imanente apenas a si mesmo. Perdemo-nos como o rio; os rostos perdem-se, esfumam-se, deformam-se, “pasan como el água.” A substância real é o contínuo passar daquilo que passa. O tempo é eterno, mas não sob a forma do mesmo – sob a forma do diferenciar. A vigília é o sonho que sonha em não sonhar, em “ver en la muerte el sueño.” A morte é a possibilidade de nos tornarmos apenas sonhadores inconscientes, sem vigília, sem sonharmos em não mais sonhar. Morrer é viver o sonho, devir inconsciente – encontrar em si a íntima solidariedade inorgância que sentimos com a dureza das pedras que ladeiam os rios. A poesia, imortal e pobre, é como o devir, e retorna: “vuelve como la aurora y el ocaso.” Como o rio interminável que permanece passando, assim como o tempo presente - como a inconstância de um Heráclito que diz “o ser é fogo, que tudo consome” -, a arte é, diz Borges, “como el rio interminable.”, “es el mismo / Y es otro.” O mesmo e outro, a arte é o que é o mesmo e o outro; a arte é o presente, que é o mesmo e o outro: rio interminável: o que fica e, ficando, passa; o que passa e, passando, fica em seu pasearse.


Máquinas de fazer sorrir: notas sobre uma economia da felicidade

25 novembro, 2009


por Murilo Duarte Costa Corrêa

1. Em 1972, Jigme Singye Wangchuck, soberano do Butão, criou o termo FIB (Felicidade Interna Bruta) ao responder à crítica de um jornalista que afirmava, a partir do PIB (Produto Interno Bruto), que a economia butanesa apresentava uma miserável taxa de crescimento.

2. No fim do ano de 2009, a cidade de Foz do Iguaçu – conhecido acesso ao consumo de importados por encontrar-se incrustada na fronteira entre Argentina, Brasil e Paraguai –, recebeu a 5º Conferência Internacional sobre o índice FIB, de Felicidade Interna Bruta, sob o título “Felicidade Interna Bruta na prática”.

3. Os critérios avaliados pelo índice, grosso modo, são nove: (1) o bem-estar psicológico, o atual estado de satisfação do indivíduo e grau de otimismo em relação ao futuro; (2) a saúde, avaliada acerca da eficiência de políticas de saúde sob o enfoque na auto-avaliação do sujeito sobre sua própria saúde, invalidez, comportamentos de risco etc; (3) gestão equilibrada do tempo (relação entre tempo empregado em atividades comunitárias, de educação e lazer e tempo gasto com tráfego no interior das cidades, no trabalho etc.); (4) vitalidade comunitária, que diz respeito ao nível de interação, à sensação de pertencimento, a segurança em casa e na comunidade, e práticas de voluntariado; (5) educação, formal e informal, avaliada inclusive a partir de competências, valores e educação ambiental; (6) cultura, cuja analise tem por base as práticas rituais, festividades, os níveis de possibilidade de manifestações artísticas e os índices de discriminação baseados em etnia, religião etc.; (7) meio ambiente, avaliado com base na percepção dos cidadãos em razão  qualidade da água, do ar, do solo, e da biodiversidade. Os indicadores incluem acesso a áreas verdes, sistema de coleta de lixo, etc.; (8) governança, que afere como a população enxerga o governo, a mídia, o judiciário, o sistema eleitoral, e a segurança pública, em termos de responsabilidade, honestidade e transparência. Também mede a cidadania e o envolvimento dos cidadãos com as decisões e processos políticos; (9) padrão de vida, que avalia a renda individual e familiar, a segurança financeira, o nível de dívidas, a qualidade das habitações, etc.

4. Michel Foucault analisara, no curso do biênio 1978-1979, intitulado Nascimento da biopolítica, todo o iter econômico-político que conduziria a Alemanha, a França e os Estados Unidos a um projeto liberal. Sua manifesta intenção, no curso, era a de falar sobre as condições sob as quais uma modificação operava-se no seio do governo dos homens, fazendo-o assumir, vez por todas, o encargo da vida: trata-se do biopoder ou da biopolítica. O liberalismo econômico, como forma de governo, pôde embasar duas vias substancialmente distintas, na Alemanha e na França: de um lado, sustentar um Estado nascente sobre o mercado, no caso alemão, de modo que não havia sequer estrutura estatal para limitá-lo, mas era o caso de constituir o Estado circunscrevendo-o a partir da economia de mercado. Do lado francês, o liberalismo fez frente ao desafio de limitar o poder por meio da afirmação de liberdades consideradas fundamentais, segundo um esquema paradoxal de produção, organização, consumo e destruição de liberdades. Nos Estados Unidos, toda uma aplicação da grade de análise econômica, e de seus princípios de inteligibilidade, aos fenômenos sociais complexos, gerando uma economização de todo o campo social, permitiu que se desenvolvesse, sobretudo, uma vitalpolitik. Para os gregos, economia (οικοηομία) era o governo de uma casa, do όικος, o lugar em que se vive.

5. As modernas Cartas de Direitos Humanos, numa realização documental da mesma política que fundara a pólis grega, em Aristóteles, incumbiram o esquema político-governamental, territorializado no Estado-Nação, de produzir as formas de vida como estratégia governamental total. Assim, as formas de vida, desviantes ou normais, socialmente desejáveis ou não, tornam-se coextensivas das formas de vida modelares produzidas pela biopolítica contemporânea – aquilo que Giorgio Agamben definira como o dar forma à vida de um povo. Não é por acaso que a Constituição dos Estados Unidos da América declara ser um direito humano fundamental a persecução da própria felicidade (the pursuit of happiness). Extraído historicamente do individualismo liberal, o direito de perseguir à própria felicidade tornou-se, hoje, o direito de gozar uma boa, e irrestrita, felicidade. O que antes era um direito negativo – os aparelhos de Estado não deveriam obstar o exercício do direito de cada um perseguir a própria felicidade –, tornou-se, a partir da implantação do modelo de Estado de bem-estar social (Welfare State), uma incumbência das políticas governamentais. Propiciar e chancelar o bem-estar psicológico, a sensação de satisfação e conforto em relação à própria vida, instituídos como tarefa da política, não deixa de ser uma das mais atuais estratégias de subjetivação-dessubjetivação. Na medida em que faz as vezes de aferidor desse “gozo-vivente”, o índice FIB (Felicidade Interna Bruta), não por acaso, privilegia e chancela a percepção subjetiva do cidadão, como ato final da completa destituição da possibilidade de governarmos nossas próprias vidas – isto é, da possibilidade de estabelecer qualquer relação consigo mesmo: isso que, em Michel Foucault, inaugurava o ‘resistir’, a dobra da força do de-fora, como dissera Gilles Deleuze.

6. A governamentalidade contemporânea passa, dentre outras estratégias de subjetivação-dessubjetivação, por encarnar a função que o gozo decepcionante (Gilles Lipovetsky) das sociedades espetaculares e de consumo (Guy Débord) não pode encampar completamente: uma máquina de fazer sorrir. Desde os gregos, a felicidade foi convertida em tarefa da política, mas a felicidade sem possibilidade de pensamento não pode ser mais que um gozo, um sentimento reativo: não pode nada, senão permanecer no continuum desse gozo. A felicidade, aferida segundo as formas de vida governamentais, normais ou desviantes – pouco importa – implica, em verdade, uma das realizações finais da biopolítica: separando a vida da forma de vida, sacraliza-se não apenas a vida, mas também a forma que essa vida pode assumir; interdita-se o próprio acesso à política, à comunidade, à felicidade.

7. Por outro lado, na ponta extrema de uma linha de fuga, político já é o ser, já é a diferença; comum, já é a experiência do pensamento. A felicidade, capturada pelo aparelho de estado como uma tarefa governamental, não pode ser incumbência da política. Desde Spinoza, a vida beata (feliz) é a própria vida filosófica. Enquanto isso, ainda em sentido spinozano, padecemos de uma paixão: sujeitamo-nos à servidão ao não conseguirmos despregarno-nos de nossos próprios afectos; conservamos, apenas impotência – a mesma impotência do gozo imóvel do consumo ou do riso fácil, que saem automáticos e fluidos da máquina de fazer sorrir.
Uma última palavra sobre a felicidade como tarefa da filosofia, deixo para a Ethica spinozana: “Quando a mente considera a si própria e sua potência de agir, ela se alegra, alegrando-se tanto mais quanto mais distintamente imagina a si própria e a sua potência de agir.” Dito isso, já não será impossível compreender por que a captura da tarefa de prover a felicidade dos homens pela governamentalidade biopolítica implica, ao mesmo tempo, a destruição da experiência do pensamento como da possibilidade de toda política: daquilo a partir de que se pode fazer comunidade: potentia intellectus.


Da série “micro-fascismos”: sobre mangas e direitos fundamentais

24 novembro, 2009





Diego Gomes Martins, de nove anos de idade, morreu eletrocutado quando tentava pular uma cerca elétrica para pegar uma manga na casa do vizinho. O amigo, Daniel Diego, de 10 anos, também ficou ferido e está internado em estado grave. Os moradores do bairro depredaram a casa onde ocorreu o acidente – móveis e eletrodomésticos que guarneciam a residência foram saqueados. O vizinho foi preso em flagrante por roubo de energia – já que se constatou que o proprietário havia desviado um fio da rede elétrica com a finalidade de eletrificá-la– e vai responder por homicídio culposo.
*  *  *
A discussão nos meios de comunicação de massa é imediatista e superficial: desejam colocar-nos num beco sem saída contrapondo o direito de autodefesa contra violações de domicílio, do dono da mangueira, ao direito à vida dos pequenos. Longe de querermos pensar, como um Ronald Dworkin, que a ponderação de princípios basta para resolver isso; longe de querermos, também, dissertar sobre o uso de ofendículas (que, no Brasil, são tão numerosas e variadas, que alguém que caminhe por algumas das regiões mais nobres de uma grande cidade como São Paulo pode, de repente, ter a impressão de ter sido jogado, inconsciente, em algum campo de concentração).
O que acontecimentos como esse dão à vista, não passa por nada disso: nem direitos morais das partes, nem direitos fundamentais, nem colisão de princípios, nem ponderação de valores: dá-nos conta de nosso próprio totalitarismo; e como Deleuze acertara ao nos alertar sobre o fascismo de nosso próprio desejo: “vigiar o fascista e o demente em nós...”, ele e Guattari escreviam em Mille Plateaux.
Não adianta convocar todos os advogados criminalistas, promotores de justiça, nem mesmo o Juiz-Hércules imaginário de Dworkin para apurar os direitos morais das partes e responder à indecidível questão que os massmedia propuseram: “A quem se deve atribuir a culpa? Aos garotos traquinas ou ao proprietário ignorante e imprudente, que estava tentando se defender?”.
Michel Foucault já havia investigado a guerra como relação social fundamental no curso do biênio de 1975-1976, intitulado Il faut défendre la société, e pôde descrever a lei como a dominação resultante do sangue e da lama das batalhas - não como a desejável pacificação. O estado de guerra, moral e factícia, em que vivemos só pode produzir corpos mortos e  cada vez mais disciplina. Ele se baseia em micro-fascismos desejados por todos nós, e por todos os lados. As cercas eletrificadas: o sonho de consumo da classe média para proteger a TV de plasma, adquirida em vinte prestações sem juros - e uma dezena ainda por pagar...
Um momento como esse não deve servir ao julgamento moral apressado das apresentadoras de telejornal, e suas caras e bocas de mães zelosas, nem às testas franzidas dos partners masculinos, que mais parecem pais aflitos (algo me lembra Débord, principalmente a tese n. 9 de La société du spectacle, que dizia algo como "Num mundo realmente invertido, o verdadeiro não passa de um momento do falso").
Essas pequenas catástrofes quotidianas só mostram o fundo sangrento das instituições – ou, como diria Nietzsche, “o sangue que há no fundo de todas as coisas ‘boas’”. Mostram, também, que a civilização, com todo o seu humanismo de escolas, fábricas, liberdades civis e penitenciárias, não deixa de demonstrar o vergonhoso compromisso de nossas instituições democráticas com a servidão voluntária, a sujeição e o degredo. E o direito nisso tudo? O direito é o que não pode resolver nada disso. Então, para desencargo de consciência, punimos “os responsáveis” (i.e., “os sobreviventes”), dando graças a Deus de que as crianças estão, ou logo estarão, mortas – é menos incômodo, e dá mais IBOPE do que pensar.


Hoje: Luigi Ferrajoli no CPGD/UFSC

23 novembro, 2009




[Evento] - O CPGD convida todos os interessados a participar da palestra \"O Paradigma do Estado Constitucional\", proferida pelo jurista italiano Luigi Ferrajoli. Acontecerá no dia 23 de novembro, às 17h no auditório do CCJ, na Trindade, Florianópolis.


Luigi Ferrajoli é um jurista italiano, conhecido no Brasil por ter sintetizado o Garantismo Jurídico na obra "Direito e Razão - Teoria do Garantismo Penal", publicada, entre nós, pela editora Revista dos Tribunais.


Desejo e causa imanente: Baruch de Spinoza por Gilles Deleuze

21 novembro, 2009


O desejo deleuziano dispõe de algo como uma causa imanente, cujo conceito Deleuze extrai de Spinoza, por oposição à causa imanativa, e que pode ser assim delineado: (1) a causa imanente é algo que não sai de si; (2) uma causa é dita imanente quando o efeito é, ele mesmo, imanado na causa, ao invés de emanar dela; (3) o efeito encontra-se na causa imanente, mas já como numa outra coisa, e nela persevera; (4) do ponto de vista da imanência, a distinção de essências já não exclui nem negativiza, mas implica uma igualdade do Ser, na medida em que é o mesmo ser que resta em si na causa, mas também na qual o efeito permanece como em uma outra coisa; (5) a imanência implica uma pura ontologia, uma teoria do ser em que o Uno não passaria da propriedade da substância e disso que é; (6) a imanência em estado puro exige um Ser unívoco que forma uma Natureza, e que consiste em formas positivas, comuns à causa como ao efeito; (7) a causa, portanto, embora se encontre em uma posição de superioridade, não condiz com um princípio que estivesse para além das formas que se encontram, elas mesmas, presentes no efeito, na medida em que o que a causa dá ao efeito não lhe é nunca superior. Assim, a imanência opõe-se a toda teologia negativa, a todo método analógico, e a toda concepção hierárquica do mundo. Na imanência, diz Deleuze, tudo é afirmação.

Tela de Henri Matisse, Odalisque, 1923.

Deleuze e o simulacro: "reversão do platonismo" e diferença

20 novembro, 2009



Paul Klee, Highway and Byways (1929)
Oil on canvas, 32 5/8 x 26 3/8
por Murilo Duarte Costa Corrêa


Quando Deleuze escrevera Platão e o Simulacro, publicado originalmente no ano de 1967 e, depois, em 1969 como apêndice a Lógica do Sentido intitulado “Os simulacros e a filosofia antiga”, buscava reconstituir o projeto nietzscheano de provocar a “reversão do platonismo”. Não por acaso, 1968 foi o ano em que Deleuze publicara um trabalho que marcou, segundo ele, o momento em que deixou de fazer história da filosofia e passou a fazer, propriamente, filosofia: Diferença e Repetição, em que o filósofo também toca o projeto nietzscheano – aliás, o livro todo é atravessado por ele, bem como por uma forte influência de Henri Bergson.
Naquele texto sobre Platão, Deleuze pergunta-se o que significaria “reverter o platonismo”. A dialética platônica não é marcada pela contradição, mas pela rivalidade (amphisbetesis), e se vai operá-la a fim de, por intermédio de uma série “fundamento, objeto da pretensão e pretendente”, separar muito bem essências e aparências, o inteligível e o sensível, a Idéia e a imagem, o original e a cópia, o modelo e o simulacro.  É aí que Platão dividiria em dois o domínio das imagens-ídolos: de um lado, selecionando-as como bons pretendentes, pois revestidos de semelhança, bem fundamentadas, as cópias-ícones; de outro lado, signos de objetos mergulhados em dessemelhança, os simulacros-fantasmas, maus pretendentes.
A semelhança, porém, como Deleuze adverte, não constitui uma relação exterior; pelo contrário, o pretendente conforma-se ao objeto pretendido na medida em que se modela sobre a Idéia. A cópia, pois, será a fiel reprodução da Idéia sobre a qual se sustenta. Já o simulacro não passa pela Idéia, mas pretende o que quer que seja graças a uma pretensão não fundada, a recobrir uma dessemelhança e um desequilíbrio interno. Pois bem. Cópia e simulacro, definitivamente, são imagens. A diferença é que a cópia constitui uma imagem dotada de semelhança, enquanto o simulacro, uma imagem ausente de semelhança. Deleuze, por isso, observa que “O simulacro é construído sobre uma disparidade, sobre uma diferença, sobre uma dissimilitude”.  Essa é a razão pela qual não se pode definir o simulacro referenciado-o pelo modelo, pois ele não o pretende; pelo contrário, destoando infinitamente, o simulacro não deriva do modelo do mesmo, mas de um modelo do outro; sua dessemelhança interiorizada constitui um modelo outro, incluindo, mesmo, o ângulo do observador, integrando-o ao próprio simulacro.
É negativizando o simulacro como a cópia improdutiva, inservível, que o platonismo, segundo Deleuze, instaura, finalmente, o domínio que a filosofia, a partir de então, reconhecerá como seu: “o domínio da representação preenchido pelas cópias-ícones e definida não em relação extrínseca a um objeto, mas numa relação intrínseca ao modelo ou fundamento”.  O platonismo, em Deleuze, como em Nietzsche, significará fazer da filosofia um território do mesmo ou do semelhante, buscando limitar, tanto quanto viável, os devires do simulacro e, “para essa parte que permanece rebelde, recalcá-la o mais profundo possível, encerrá-la numa caverna no fundo do Oceano (...)”.
Apenas com o Cristianismo é que haverá um deslocamento muito sensível: não se tratará mais de fundar a representação, com limites, finita; muito mais, o problema estará em fazê-la valer também para o ilimitado, estará em torná-la ao mesmo tempo infinita e infinitesimal, “abrindo-se sobre o Ser além dos gêneros maiores e sobre o singular aquém das menores espécies”.  Esse é o mundo das representações, aquele que nos convida a pensar a diferença a partir de uma semelhança ou de uma identidade preliminar. O mundo dos simulacros, diz Deleuze, nos convida “a pensar a similitude e mesmo a identidade como produto de uma disparidade de fundo”.  Se, como vimos, o simulacro já não se referencia pelo modelo do qual teria desviado originalmente, basta “que a disparidade constituinte seja julgada nela mesma”, sem referência ou reporte a uma identidade anterior, preliminar ou pré-constituída.
O simulacro não será mais uma cópia infinitamente degradada, como quisera Platão; não será mais degradada, pois jamais fora cópia. Ele encerra singularidade, diferença, acontecimento e, portanto, nas palavras de Deleuze, encerra também uma “potência positiva que nega tanto o original quanto a cópia, tanto o modelo como a reprodução”;  seu nome não é menos que o real, na medida em que é o real em sua multiplicidade. Nenhum modelo, nem mesmo outro, resistirá à sua vertigem, pois simulacro é radical diferença, e na medida em que nega tanto o modelo quanto a cópia, não mais será passível de hierarquização na ordem de pretendentes de Platão. Eis a reversão nietzscheana do platonismo: quando emergem os simulacros, quando se entrevê, atrás de cada caverna, “um mundo mais amplo, mais rico, mais estranho além da superfície, um abismo atrás de cada chão, cada razão, por baixo de toda ‘fundamentação’”.  Mais e mais profundo, mas não por isso fora ou além da imanência: o mais profundo, dizia Valéry, é a pele. Como o eterno retorno nietzscheano,  não constitui um novo fundamento, nem um novo modelo: alegremente, positivamente, o simulacro como diferença em si, como pura imanência, engole todo modelo e todo fundamento, e com eles todos os objetos transcendentes.
Embora anos mais tarde Deleuze fosse abandonar a palavra "simulacro" - ao menos, é o que afirmava no ano de 1990, na Lettre-préface a Variations: la philosophie de Gilles Deleuze, livro de Jean-Clet Martin dedicado à filosofia de Deleuze ("il me semble que j'ai tout a fait abandonné la notion de simulacre, qui ne vaut pas grand-chose"), "simulacro", "diferença" e "multiplicidade" constituem diferentes instantes poéticos de uma só e mesma heterogênese: a única voz do ser, que se diz apenas da diferença; numa palavra: a imanência. O conceito, como a criação que se põe num plano de imanência (corte e crivo que age a partir do caos), também comporta zonas intensas de variação.


Fundamentos Críticos de Direito Penal, de Guilherme Merolli

19 novembro, 2009



[Lançamento] - Universidade Federal do Paraná, meados de 2004 – e lá se vão cinco anos! Seis meses depois de não termos tido qualquer notícia do que viria a ser Direito Penal A (Propedêutica jurídico-penal, Teoria da Lei Penal, Teoria do Crime e Teoria da Pena), chegava até nós Guilherme Merolli, recém-saído do Mestrado naquela casa, professor, àquele tempo, da Faculdade de Direito de Curitiba (hoje, Centro Universitário Curitiba). Um professor que valia por todas as aulas que não havíamos tido com o Titular da cadeira. Uma metodologia de aula dinâmica, simples – mas sem descuidar da profundidade teórica, crítica, garantista e humanista, que são a assinatura pessoal de Merolli em suas aulas –, ou seja: o suficiente para conquistar todo e qualquer aluno iniciante nas ciências criminais. E as aulas eram ministradas à noite, na sexta-feira, voluntariamente, para alunos de segundo ano que mal haviam saído das barras das disciplinas propedêuticas – muitas delas, como sociologia do direito, filosofia do direito, teoria da Constituição etc., estavam ainda a pleno vapor...
Para resumir tudo, um professor digno de toda homenagem, pela seriedade e dignidade de seu trabalho científico e didático – mas também pelo encantamento desse encontro que nos marcou a todos; por termos sido, por suas mãos, conduzidos às primeiras iluminações nas ciências penais. Felizmente, uma rara e querida amizade que fizemos lá, e (todos de nossa antiga sala) cultivamos até os dias de hoje. E lá se vão cinco anos...
Uma outra felicidade que tivemos – um reencontro muito generoso do destino –, foi quando, estando em Florianópolis, em meados do primeiro ano do Mestrado no CPGD, recebia, por celular, uma mensagem muito amigável do Merolli: dava a notícia de que estava de mudança para Florianópolis, assumindo a disciplina de Direito Penal I (o equivalente de nossa antiga “Direito Penal A”, dos tempos de voluntariado na UFPR), na Universidade Federal de Santa Catarina.
Como fruto de seu amaduramento dogmático, das pesquisas e do trabalho docente desenvolvidos nesses mais de sete anos, Merolli nos presenteia, no fim desse ano, com um livro de leitura indispensável: “Fundamentos Críticos de Direito Penal”, que colige o material das aulas desenvolvidas e preparadas com tanto esmero por nosso querido mestre.
Seu duplo lançamento terá lugar, primeiro, em Florianópolis, na próxima terça-feira, dia 24.11.2009, a partir das 18h30, no auditório do CCJ/UFSC, Trindade. Aqui em Curitiba, o lançamento será feito no dia 26.11.2009, quinta-feira, a partir das 18h30, no Salão Nobre da Faculdade de Direito da UFPR, 1º andar do Prédio Histórico da Praça Santos Andrade.


Abaixo, retirados do site da excelente editora Lumen Juris, seguem a imagem de capa do livro de Merolli, e um breve resumo do enfoque desse livro que enriquece a dogmática crítica do Direito Penal contemporâneo, e cuja gênese, nós, ex-alunos (mas, é claro, eternos alunos) do professor e amigo Guilherme Merolli, tivemos o privilégio indizível de experenciar juntamente com ele.



“Este Curso procura lançar as bases para uma reorientação da Dogmática Jurídico-Penal sob uma perspectiva principiológica. Para a realização deste objetivo, no entanto, é necessário, em primeiro lugar, desmistificar e desarticular teoricamente a renitente dogmática positivista, já que esta – ao deitar raízes na objetividade da lei, na neutralidade do intérprete e na auto-suficiência do direito –, mostra-se apenas como um discurso apto a relegitimar a hegemonia social e a dominação econômica vigentes. Dentro desse contexto, a ruptura do método da linearidade histórica e a revisitação dialética das demais ciências penais (Criminologia e Política Criminal) constituem premissas fundamentais para a concretização deste primacial exercício desestruturador. (...) Num segundo momento do Curso, procura-se resgatar a dimensão positiva das chamadas “teorias críticas do direito”, enfatizando que somente a afirmação da eficácia normativa dos princípios penais constitucionais e a consequente releitura de todo o direito penal à luz da Constituição Federal é que permitirão à Ciência do Direito Penal volta-se à promoção da dignidade do Homem.” (Fonte: site da Lumen Juris).

A navalha de Gilles: Deleuze e a ruptura

14 novembro, 2009



[Ensaio]Com uma satisfação intensa, dou a conhecer que a Biblioteca Online de Ciêncas da Comunicação, da Universidade da Beira Interior (BOCC/UBI), localizada em Covilhã, Portugal, acaba de publicar um ensaio que escrevi sobre a filosofia de Deleuze a partir do conceito de ruptura. O ensaio inicia pelo delineamento da ontologia deleuziana da diferença, para, em seguida, estender-se pela análise da ética, da política, da subjetivação em Deleuze, até chegar à análise - entrecruzada com L'immanenza assoluta, do jurista e filósofo italiano Giorgio Agamben - do último texto a que Deleuze dera seu imprimatur: L'immanence: une vie...
Para quem desejar acessar diretamente o texto em PDF, o link está aqui!
Para quem preferir conferir esse, dentre outros ensaios publicados, pode acessar o Scribd clicando aqui!

Henri Bergson: Introdução à metafísica

13 novembro, 2009





A resenha que segue foi originalmente publicada em meados desse ano (2009), na revista Captura Críptica: direito, política, atualidade, do Curso de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal de Santa Catarina. Segue o link, para quem preferir ler em PDF: http://www.ccj.ufsc.br/capturacriptica/costacorrea4(n1v2).pdf


Resenha. BERGSON, Henri. Introdução à metafísica. In: O pensamento e o movente. Ensaios e conferências. Tradução de Bento Prado Neto. São Paulo: Martins Fontes, 2006, p. 183-234.
por Murilo Duarte Costa Corrêa ·
  
             Henri Bergson (1859-1941) tornou-se conhecido entre nós em virtude do belo trabalho de Bento Prado Júnior, Consciência e Campo Transcendental,[1] de 1964/1965, que aguardou nas gavetas de Prado Júnior por quase vinte anos até ser publicado, com grande ressonância e admiração de filósofos e leitores no Brasil e mesmo na Europa. No ano de 1966, Gilles Deleuze publicava pelas Éditions PUF um trabalho que já não era, como seus anteriores, um “Kant”, ou um “Nietzsche”, mas Le bergsonisme.[2] O próprio Bento Prado, que se tornara amigo pessoal de Gilles Deleuze, diria, anos mais tarde, que se Deleuze tivesse publicado Le bergsonisme um ou dois anos antes, ele teria perdido o leitmotiv de sua tese de livre-docência.
Hoje, quando o belíssimo livro de Bento Prado Júnior encontra-se infelizmente esgotado, chegam ao Brasil, na excelente tradução de Bento Prado Neto, finalmente, muitos dos textos e cursos de Bergson a que só teríamos acesso na língua original. Entre eles, está esse pequeno-grande ensaio chamado Introdução à metafísica, publicado no ano de 1903, e depois republicado, com alterações, entre os diversos textos de O pensamento e o movente.
            Sucessor de Jean-Gabriel de Tarde – que foi o maior contendor de Émile Durkheim –, falecido em 1904, na cadeira de Filosofia Moderna do Collège de France, Henri Bergson, é conhecido por ter elevado a intuição à condição de método filosófico, à condição de método metafísico. Nisso está sua influência kantiana, que aparece singularmente em Essai sur les donnés immédiates de la conscience,[3] e a superação dessa influência em direção à concepção de um tempo não-espacializado que vai arrebentar, em seus últimos textos, em uma filosofia da vida.
Veremos que Bergson põe em xeque a metafísica tradicional. Ele a reconduz à terra, ao tempo liberado de referenciais espaciais,  e à vida; e tudo começa pela intuição. Por isso, Introdução à metafísica afigura-se um texto crucial na bibliografia bersgoniana. Em Bergson, ser metafísico não tem nada com a transcendência, mas, antes, com a constituição de um campo imanente de experiência, ou com a consciência constituída como um campo transcendental, que é a experiência que desenha as condições da imanência. Assim, a intuição vira método que põe em questão nossas formas decantadas e transcendentes de conhecer os objetos. É na experiência imanente que dá suporte à intuição que Bergson realiza mais que uma viragem, uma verdadeira ruptura na história da filosofia. Em Bergson, o pensamento dura, e a metafísica não poderia ficar intocada, nem sequer continuar a mesma...

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Como se conhece uma coisa? Os metafísicos tendem a dizer que há duas formas: primeiro, o conhecimento que consiste em dar voltas ao redor da coisa; conhecimento de perspectiva, e que depende diretamente dos símbolos por que se expressa. Segundo, o conhecimento que entra na coisa, que não conhece por perspectiva e não se apóia na sua expressão. Quanto ao primeiro modo de conhecer, chamamo-lo relativo; ao segundo, absoluto (Bergson, 2006: 184).
Primeiro, um conhecimento do exterior do objeto, capaz de descrever seu movimento segundo a sucessão de suas posições no eixo tempo-espaço. Segundo, um movimento absoluto será aquele que experencio imaginativamente por atribuir ao objeto um interior e como que estados de alma; “também porque me simpatizo com os estados e neles me insiro por um esforço de imaginação” (Bergson, 2006: 184). Experimento o objeto, faço de seu movimento minha experiência dele, nele – assim, diz Bergson, apreenderei um absoluto.
Num romance, por mais intenso que seja, só o experencio verdadeiramente ao preço de fazer-me, num ponto singular, coincidir com a personagem. Símbolos, pontos de vista, me colocam de fora dela; não entregam a mim aquilo que é próprio a ela (Bergson, 2006: 186). O que é próprio dela não poderia ser visto de fora – é uma dobra interior, inexprimível, de que só posso ter experiência ao preço de coincidir com ela, sem que o símbolo que dela faço, sem que sua representação a meus olhos de alhures possam dizer ou ver sua singularidade mais essencial. É por isso que Bergson diz que aí há uma perfeição, na medida em que a coisa é perfeitamente aquilo que ela é, e também infinita, pois se dá em uma apreensão indivisível e segundo uma enumeração inesgotável.
Aqui, Bergson vem cavar seu método para conhecer o absoluto: a intuição. Ao conhecimento relativo, exterior, deixa o saber de análise, que, por ver de-fora, decompõe o movimento, situa-o no espaço e espacializa o tempo. Intuição, ao contrário, será “a simpatia pela qual nos transportamos para o interior de um objeto para coincidir com aquilo que ele tem de único e, por conseguinte, de inexprimível” (Bergson, 2006: 187).
Assim, a intuição não multiplicará pontos de vista sobre o objeto, como na análise – no afã de apreender o essencial; ela será um ato simples. Se, portanto, a ciência positiva não pode conhecer senão ao preço de passar pela análise, de simbolizar, de sustentar-se sobre a expressão daquilo que é conhecido – fadado a nunca ser ele mesmo –, Bergson dirá que a metafísica é a ciência que pretende passar-se de símbolos (Bergson, 2006: 188).
Contudo, tal experiência interior de um outro ser parece demasiado imaginária, não é? Não para Bergson, para quem a experiência fundamental, propriamente interior, inultrapassável pela análise, é a de nossa própria pessoa – a cujo interior, sem dúvida, somos simpáticos – no escoamento do tempo: nosso eu que dura.
Sobre mim, minha imagem, minhas virtuais lembranças que sobrevivem ao presente e lançam o futuro, sentimentos que vêm com elas e cristalizam-se, percepções que se expandem numa esfera que tende a se alargar e derramar-se no mundo exterior. Se, de outra sorte, me contraio, encontro por baixo desses cristais uma continuidade de escoamento que não se compara com nada exterior. “É uma sucessão de estados, cada um dos quais anuncia aquilo que a ele se segue e contém aquilo que o precede. A bem dizer, só constituem estados múltiplos quando já os ultrapassei e me volto para trás para observar-lhes o rastro”, escreve (Bergson, 2006: 189).
Nenhum desses rastros começa ou acaba – eles se prolongam indefinidamente uns nos outros: prolongamento contínuo de um meio heterogêneo. A memória é aquilo que permite dizer que a consciência é o que é profundamente desigual a si mesma. Só uma consciência sem memória, sem que seu passado estivesse implicado no presente que devém novo, poderia ser idêntica a si mesma em dois momentos diferentes.
Não há imagem possível para dizer isso que Bergson diz: pois é a experiência da consciência a única que autoriza a compreender o que Bergson tenta expressar em palavras. Sem, no entanto, conseguir, a inexpressibilidade dessa consciência não faz senão confirmar sua intuição transformada em método metafísico.
Esse movimento da duração de si não seria como um novelo de lã a enrolar-se sempre, pois exige uma multiplicidade como meio; tampouco seria um espectro de cores, pois sua variação ocupa espaço, justapõe-se – e isso seria recair no kantismo de um tempo espacializado. Não seria um exemplo desejável, na medida em que a duração pura exclui toda idéia de justaposição, exterioridade recíproca e extensão. Ela é multiplicidade virtual e contínua, irredutível ao número, segundo Deleuze (Le Bergsonisme, 1966: 31). Há que divisar a força que repuxa a linha de um ponto, e o traço que essa intensão deixa no espaço na forma de linha, como rastro de sua ação indivisível. O rastro passa por mil pontos, mas a linha é um movimento indivisível (Bergson, 2006: 191). Enfim, toda imagem será incompleta: “pois o desenrolar de nossa duração se assemelha por certos lados à unidade de um movimento que progride, por outros a uma multiplicidade de estados que se esparramam, e nenhuma metáfora pode restituir um dos aspectos sem sacrificar o outro” (Bergson, 2006: 191). E se essa vida interior, variedades qualitativas, continuidade de progresso e unidade de direção, não pode ser representada por imagens, tampouco conceitos, abstrações, ou universalidades poderão restituir-me a sensação de experimentar minha própria duração, o escoamento de mim mesmo. (Bergson, 2006: 192)
Não se trata, como reconhece Bergson, de restituí-lo pela filosofia – mas se trata de não substituir o conceito à própria duração; o que não se pode fazer dizendo ser metafísica é dizer que o ser diz-se num conceito que não passa da expressão de uma perspectiva sua que sequer é interior ao ser conceituado. À expressão que substitui o objeto exprimido, Bergson chama símbolo (Bergson, 2006: 193). A semelhança que baseia a expressão do objeto no símbolo é justamente aquilo que não é capaz de recortar sua essência – o que aproxima o objeto do símbolo é precisamente aquilo em que ele não difere e, portanto, aquilo que ele não é. Não conhecemos as palavras senão por seus sinônimos – daí que elas sejam pura exterioridade, não possuam um interior, uma essência, um ser. Hegel já havia percebido que a linguagem opera uma inclusão-exclusiva do ser na língua, ao nomeá-lo, e Agamben lembra que a palavra representa a coisa, mas não a contém.[4] O que Agamben diz é que não há um fora na língua; Bergson diria que a língua, porque expressa o ser sem poder sê-lo, não pode ser senão o espaço do fora mais radical do ser.
Não há, aí, apenas uma ilusão, mas também um perigo, que parece consistir no fato de que o conceito não apenas generaliza, mas abstrai a coisa de que constitui representação (Bergson, 2006: 194). Por isso, se a metafísica não for um jogo de conceitos, mas uma ocupação mais séria, deverá transcender os conceitos para chegar à intuição, libertando-se de conceitos prontos para criar conceitos novos, representações tão fluidas e fugidias quanto a própria intuição (Bergson, 2006: 195).

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Que se possa dizer que a duração é multiplicidade não-coincidente com nenhuma outra multiplicidade, e que constitui uma unidade móvel, cambiante, viva, colorida, não basta para afetar a duração da forma como é possível afetá-la pela experiência do eu pelo próprio eu (Bergson, 2006: 196). Pensemos na psicologia. Bergson diz que não há sentimento que não encerre virtualmente o passado e o presente do ser que o experimenta, e que daí possa ser separado para constituir um estado – senão por obra da abstração ou da análise (Bergson, 2006: 197). E, justamente, esse esforço de abstração e análise constitui precisamente a ciência da psicologia – mas não se pode dizer, contudo, que aí se apreende um sentimento em todas as suas virtualidades, pois elas são inexprimíveis, como a mobilidade da vida interior, seu colorido, sua vivacidade.
Uma cidade se conecta, e só é possível conhecer uma torre separando-a desse todo que ela é por análise: Paris / Torre de Notre-Dame. A experiência de Paris, o mapa de Paris. Pisar Paris e ter a sensação de “ver” Paris no Google Earth. A que, com efeito, pode-se chamar conhecer uma cidade? Ocorre o mesmo com a pessoa de quem o psicólogo extrai um estado psicológico – não passa de um croqui que dará início a uma recomposição artificial daquele sujeito (Bergson, 2006: 198). Não é possível reconstruir uma coisa por meio de operações exclusivamente simbólicas: é como fazer a montage de um poema que nunca lemos quando alguém nos oferece, recortadas, todas as letras que há no tal poema, diz Bergson (Bergson, 2006: 199). Não há partes componentes, mas expressões parciais, incapazes de reconstruir a coisa que simbolizam.
Roland Barthes já dizia que a lógica do texto é metonímica, e não compreensiva.[5] Bergson parece caminhar lado a lado com Barthes ao afirmar nas entrelinhas que toda imagem, toda metáfora, toda representação e toda linguagem não pode ser senão metonímica. Toda ciência será metonímica, para Bergson, pois apoiada na expressão do ser, e não no ser mesmo. Para Barthes, a ciência é um discurso arrogante – e talvez Henri Bergson deixe entrever, aí, mais um motivo pelo qual Barthes parece afirmá-lo com acerto. Nesse mesmo ponto, tropeçam empirismo e racionalismo, por recomporem o objeto através de traduções, de estados psicológicos, indo diferir apenas em que o racionalismo afirmará a unidade na pessoa e o empirismo, a multiplicidade de estados psicológicos (Bergson, 2006: 201). Isso não impede que ambos encontrem-se submersos no caldo da mesma ilusão – imersão que estreita muito as diferenças entre ambos, pois raciocinam sobre elementos da tradução como se fosse o original (Bergson, 2006: 203).
O que importa à filosofia não é saber que a pessoa é unidade ou multiplicidade, mas que unidade, que multiplicidade, que realidade superior ao uno e ao múltiplo, a ser conhecido na intuição do eu pelo eu (Bergson, 2006: 204). Nesse sentido, na história da filosofia, o pensamento bergsoniano foi, sem dúvida, ontologicamente mais radical que o de Martin Heidegger, e formulado quase um quarto de século antes de Sein und Zeit.[6]
A grande ruptura bersgsoniana consiste na redefinição do trabalho do pensamento: não mais ir dos conceitos à coisa, mas conhecer indo da coisa aos conceitos (Bergson, 2006: 205). Os conceitos encontram-se imóveis na medida em que se os considera; no entanto, segundo Bergson, não há estado da alma que não mude incessantemente. Isso torna impossível realizar o caminho tradicionalmente feito pela inteligência: aquele que pretende passar da análise à intuição; para Bergson, apenas a passagem da intuição à análise seria possível – e isso se deve precisamente à duração. Não há como isolar um estado de sua memória. Isto é, a duração “é vida contínua de uma memória que prolonga o passado no presente, seja porque o passado encerra distintamente a imagem incessantemente crescente do passado, seja, de forma mais provável, porque testemunha, por sua contínua mudança de qualidade, a carga sempre mais pesada que arrastamos atrás de nós à medida que envelhecemos mais” (Bergson, 2006: 208). O passado deve sobreviver no presente para que haja duração; senão, apenas haverá instantaneidade, ponto no espaço como decadência do tempo.
Tomado em si mesmo, o estado psicológico é perpétuo devir; quando se extrai dele determinada qualidade que se supõe invariável, constrói-se um estado estável e esquemático. Dele retirando o tempo como devir em geral, constrói-se não mais o devir disso ou daquilo, mas propriamente o tempo que o estado ocupa. Olhados em conjunto, tanto a apresentação esquemática do estado como a conceitualização espacializada do tempo (sucessão de momentos distinguíveis, a linha do tempo atravessando infinitos pontos, ou instantes), são igualmente imóveis e abstratos. Isso que escoava em contínua mudança qualitativa, que fazia jorrar sua diferença, tornou-se, agora um meio imóvel (Bergson, 2006: 208-209).
É necessário reconduzir o estado ao eu que dura – duração que não pode ser repartida, relacionada, imobilizada por uma tentativa de mensuração da inteligência. Instalando-se o conhecimento sobre a intuição, “Reconhece-se o real, o vivido, o concreto, pelo fato de que ele é a própria variabilidade” (Bergson, 2006: 209).
Como a mobilidade nos escapa, tendemos a assinalá-la em função do espaço, e a fazemos coincidir, por uma ilusão, com os pontos pelos quais o corpo passa – e, então, podemos dizer que imobilizamos o movimento, pois ou o corpo que se move passa por cada um dos pontos, num dado tempo, ou apenas deixa atrás de si, no espaço, um rastro de seu movimento que a intuição apreende como absoluto, como experiência interior do movimento real e indiviso (Bergson, 2006: 211). No primeiro caso, em que adicionamos ao movimento sua passagem ponto por ponto, dizemos que o corpo passa por tais ou quais pontos no espaço; e sua passagem de um ponto ao outro continua a ser algo misterioso e inapreensível, justamente porque a inteligência, ao invés de mover-se na intuição, imobiliza-se na representação do movimento. Isso ocorre porque os pontos, assim representados, não são partes do movimento, mas símbolos dele – incapazes de fabricar a realidade. (Bergson, 2006: 212). Bergson explica essa passagem impossível dizendo que o movimento é anterior à imobilidade.
Pois bem. E como fazer para que o trabalho metafísico, filosófico, não recaia em uma pura e simples contemplação de si, se, de fato, a metafísica tem por objeto a mobilidade da duração, e se a duração é de essência psicológica, embora não se confunda com tal essência?
Tal pergunta, diz Bergson, ainda impõe, em suas entrelinhas, um desconhecimento da natureza singular da duração, bem como o caráter essencialmente ativo da intuição (Bergson, 2006: 214). Mesmo porque a consciência exprime uma duração que o eu pode experenciar; mas isso não implica identificar consciência com duração; isso seria reduzir a duração a determinado estado psicológico.
Se, pelo contrário, escolho instalar-me na duração por meio da intuição, é como se considerasse a duração como uma multiplicidade de momentos conectados por uma unidade que os atravessaria a todos, e então teríamos, por menor que seja a duração, momentos em um número ilimitado. Houvesse apenas instantaneidade, teríamos uma pluralidade de momentos dispostos a desvanecer; de outro lado, se aprofundamos a intuição sobre a unidade, tenderemos a enxergar na duração uma certa eternidade, um essencial intemporal do próprio tempo – eternidade da morte, uma vez que a mobilidade do tempo é a própria vida. (Bergson, 2006: 216).
No escoamento concreto da duração, não poderia haver nenhuma duração além da nossa, como na cor alaranjada: podemos seguir a duração um grau abaixo, e encontrar o amarelo, como podemos seguir um grau acima, e encontrar o vermelho. De todo modo, trata-se da mesma duração, mas com diferentes graus e, diz Bergson, acima ou abaixo transcendemos a nós mesmos (Bergson, 2006: 217).
Abaixo da consciência, a pura repetição, que Bergson denomina materialidade. Acima da consciência atingimos uma duração que se tensiona e adensa, fazendo-nos aproximar de uma eternidade não mais conceitual, mas movente, vívida. Esse caminhar da intuição que se move entre os limites da materialidade e do espírito, e ali não experencia senão as diferentes velocidades da mesma duração, é o movimento metafísico do bergsonismo (2006: 218).
Diante disso, Bergson formula os princípios de seu método. Consente com o senso comum filosófico ao afirmar que “I. Há realidade exterior e, no entanto, dada imediatamente a nosso espírito” (Bergson, 2006: 218), mas curto-circuita a metafísica realista, como a idealista, quando escreve que “II. Essa realidade é mobilidade”, embora, afastando Heráclito, afirme as substâncias pelo seu movimento, por sua duração vívida: não há coisas feitas, mas coisas que se fazem – por isso, toda a realidade é, para Bergson, tendência (2006: 219).
Bergson (III) admite a inclinação da inteligência para reconhecer estados e produzir concepções estáveis – mas não se trata, aí, de fazer metafísica, de apreender a interioridade do objeto, mas de servir-se da inteligência, da utilidade dessa faculdade do espírito que, rodeando os objetos, vale-se de infinitos pontos de vista, sempre relativos, deixando escapar a própria essência do real. Isso conduz ao quarto princípio, (IV) que impede que a coisa possa ser essencialmente reconstruída em sua mobilidade vivaz a partir dos conceitos fixos (Bergson, 2006: 220). Precisamente na denúncia dessa impotência, (V) vão fixar-se as escolas céticas, críticas, mas elas terminam, em sua constatação, a dizer, como Kant, que se não podemos apreender o objeto em sua essência, se não podemos ter acesso ao absoluto, há que se conhecer o que é possível conhecer, e pela via do dogmatismo. Para Bergson, porém, (IV) o espírito pode seguir o caminho inverso, instalando-se na realidade móvel, adotando sua direção sempre cambiante, e apreendê-la intuitivamente (Bergson, 2006: 221). Por isso, o pensador francês afirmava que “Filosofar consiste em inverter a direção habitual do trabalho do pensamento”. Uma inversão que merece ser efetuada metodicamente, pela intuição, a fim de (VII) operar diferenciações e integrações qualitativas (Bergson, 2006: 223). A metafísica afastou-se desse alvo. Da necessidade de a intuição, uma vez encontrada, precisar buscar um modo de expressão (VIII), impõe-se-lhe um conhecimento simbólico, relativo, por conceitos preexistentes, que falha na tentativa de reconstituir o movente a partir do fixo.
Atingir o absoluto, diz Bergson, custa à intuição instalar-se no movente e adotar a vida mesma das coisas: ponto em que devem confluir ciência e metafísica (Bergson, 2006: 224). (IX) “(...) a filosofia deveria ser um esforço no sentido de ultrapassar a condição humana” (Bergson, 2006: 225). Talvez um nietzscheanismo de Bergson.[7]. Kant, em sua Crítica da Razão Pura, teria nos convencido de que o pensamento não é capaz de mais nada senão de platonizar, “isto é, de vazar toda a experiência possível em moldes preexistentes” (Bergson, 2006: 230).
Contra o kantismo platônico das teses imóveis, Bergson convoca uma filosofia da intuição que ainda vive nos filósofos (Bergson, 2006: 232). A intuição nada tem de misteriosa. Para chegar a ela, é necessário, primeiro, ter tido longas relações de camaradagem com as superfícies, conhecendo os fatos, fundindo-os, neutralizando-os, a ponto de “libertar a matéria bruta dos fatos conhecidos” (Bergson, 2006: 234). A metafísica, assim, não poderá ser a mera síntese desses fatos exteriores; e, embora não constitua uma generalização da experiência, deveria definir-se como a experiência integral.
Nietzsche dizia que a verdade deveria ter dois pés – embora, para sustentar-se, fosse suficiente ter um; com dois, porém, ela andaria e circularia...[8] Bergson, com Nietzsche, deram a Deleuze o deserto errático de um pensamento nômade e de uma verdade andarilha. Deram também dois pés para errar por ele – fazendo do sustentar-se sobre a terra uma ilusão dissipada na pura intensão real de um movimento absoluto.




· Professor universitário e advogado. Mestrando em Filosofia e Teoria do Direito pelo Curso de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal de Santa Catarina (CPGD/UFSC). Graduado em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná (FD/UFPR).
[1] PRADO JÚNIOR, Bento. Presença e campo transcendental. Consciência e negatividade na filosofia de Bergson. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo (EDUSP), 1989.
[2] DELEUZE, Gilles. Le bergsonisme. 3. ed. Paris: Quadrige / PUF, 2007.
[3] BERGSON, Henri. Ensaio sobre os dados imediatos da consciência. Tradução de João da Silva Gama. Lisboa: Edições 70, s. d.
[4] AGAMBEN, Giorgio. Homo sacer I: o poder soberano e a vida nua. Tradução de Henrique Burigo. Belo Horzonte: Humanitas, 2007, p. 29.
[5] BARTHES, Roland. O rumor da língua. Tradução de Mario Laranjeiras. São Paulo: Brasiliense, 1988, p. 74.
[6] Lembrando que Introdução à metafísica, de Bergson, foi publicada originalmente na Revue de métaphysique et de morale, em 1903; mais tarde, foi republicada, com algumas modificações a fim de precisar os conceitos de metafísica e ciência, de que o próprio Bergson dá conta na primeira nota a seu texto. Sein und Zeit, por sua vez, a grande obra de Heidegger, foi publicada apenas no ano de 1927.
[7] NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. Ainsi parlait Zarathoustra. Un livre par tous e pour personne. Tradução de Henri Albert. Paris: Mercure, 1947, p. 13-14.
[8] NIETZSCHE, Friedrich Wilhelm. O Andarilho e sua sombra. In: Humano, demasiado humano: um livro para espíritos livres. Volume II. Tradução de Paulo César de Souza. São Paulo: Companhia das Letras: 2008, p. 171.