As atuais teorias do direito (III): plano de organização do direito como norma

16 dezembro, 2009




Contemporaneamente, quatro são os planos de organização divisáveis na teoria do direito; quatro planos que, embora a relutância mútua sempre renovada, embora o disfarce na forçada oposição, não deixam de soprar no mesmo sentido do vento. São eles os planos do direito como norma, como processo, como interpretação e como decisão.
Bem percebidos, tanto o positivismo clássico de Kelsen  e Bobbio,  quando o pós-positivismo ou o neoconstitucionalismo de Carbonell,  Pozzolo e Ramos Duarte,  Zagrebelsky,  Dworkin,  Alexy  etc., terminam por possuir em comum a constituição do direito como norma. Ambas as matrizes, embora trabalhem de forma diversa esse território teórico, ainda assim não deixam de partilhar o mesmo espaço.
Teoricamente, há uma relativa novidade no esquema pós-positivista, consistente na transfiguração de seu objeto, segundo a qual a norma perde sua onticidade na exata medida em que a ganha a interpretação como forma de construção da norma. Vale dizer, se os paleo-positivistas ontologizaram a norma, como um dado imediato extraído do ordenamento jurídico, os pós-positivistas continuam a ontologizá-la, se bem que à sua maneira; atualmente, o que ganha existência ontológica, nas sendas do pós-positivismo, são também as normas – não mais como um dado imediato do ordenamento positivo, mas enquanto produtos extraíveis da miscigenação hermenêutica de normas (princípios e regras), valores, diretrizes políticas e discursos racionais de justificação, que, a um só tempo, lhes fornecem o substrato normativo, a sua obrigatoriedade dotada de pretensão de legitimidade e a ontologia da norma singularizada.
Dada a reconhecida precedência da norma singular, concreta, ganha vital importância o terreno decisório, pois nenhuma norma, antes da justificação racional sobre sua imperatividade, deve ser obedecida a priori, como uma obrigação derivada de um dado imediato da consciência, como teria propugnado o neokantismo de Kelsen.  Ao reduzir o direito à decisão singular, ou melhor, ao fazer da decisão o território privilegiado da normatividade do direito, essa renovada cartografia do direito que devém norma abre espaços para possibilitar recair, igualmente, no perigo do que José Eduardo Faria denominou por direito flexível, informalizado, baseado em trocas, ajustes negociados etc.