{ O gozo, a morte } [1]
Georges Bataille
Se me perguntassem “quem eu sou”, eu
responderia: eu olhei o cristianismo para além dos efeitos de ordem política, e
vi em sua transparência; através dele, a humanidade primeira apreende o horror
diante da morte, ao qual os animais não acederam, excluindo os gritos e os
gestos maravilhosos, nos quais se exprime uma conciliação no estremecimento. A
punição e a recompensa fizeram a opacidade do cristianismo. Mas na
transparência, na condição de estremecer, eu reencontrei o desejo, a despeito
desse estremecimento, de afrontar a impossibilidade estremecendo até o fim. O primeiro desejo...
Na reprodução, na violência das convulsões
das quais a reprodução é a solução, a vida não é apenas a cúmplice da morte: é
a vontade única e dupla da reprodução e da morte, da morte e da dor. A vida não
se deseja senão no dilaceramento; como as águas das torrentes, os gritos de
horror perdidos fundem-se em um rio de gozo.
O
gozo e a morte estão misturados no ilimitado da violência.
[1] Traduzido de BATAILLE, Georges. Le souverain. Paris: Fata Morgana, 2010, p. 78-79.